Eternos traz boas inovações misturadas com os erros de sempre da Marvel

Longa de Chloé Zhao consegue inovar em vários aspectos ao mesmo tempo que fica preso às amarras do “estilo Marvel”

“Eternos” conta a história dos heróis que dão nome ao filme, seres imortais que ajudaram a moldar a história da terra e protegem a humanidade desde seus primórdios dos Deviantes, criaturas malignas que matam tudo que encontram pela frente. Quando uma tragédia os força a se encontrarem novamente, eles percebem que vão precisar se unir de verdade para combater um perigo maior do que imaginavam. O lançamento da Marvel é dirigido por Chloé Zhao, ganhadora do Oscar de melhor direção e melhor filme por “Nomadland”.

Certamente uma das obras mais grandiosas da Marvel, o filme de Zhao entrega diversão ao mesmo tempo que, em partes da narrativa, decide ficar na mesmice dos outros filmes do universo. A história dos Eternos é interessantíssima e uma das partes mais divertidas são os flashbacks que mostram a influência deles na história da humanidade. A cinematografia de Ben Davis na gigante tela do IMAX é de tirar o fôlego em algumas cenas, onde o uso de cores vibrantes às vezes faz o espectador esquecer o por vezes terrível cinza sem vida que permeia a maioria dos demais filmes do estúdio. Graças a influência de Zhao, esse não é o caso aqui.

Uma das grandes questões levantadas com o anúncio da obra foi como seria explicado porque os heróis nunca se envolveram em nenhum conflito até então, já que são alguns dos seres mais fortes dentro do universo. A explicação que eles dão é crível o suficiente para aceitar e curtir a história.

Onde “Eternos” manifesta talvez sua maior falha é ao construir momentos importantes da narrativa baseando-se em pontos de virada muito previsíveis. Enquanto a obra apresenta ótimas e empolgantes cenas de ação e o tipo de entretenimento pipoca que é esperado de um filme de super heróis, um diálogo em seu início deixa óbvia a primeira de algumas reviravoltas, que é revelada de uma forma que deixa clara a intenção de chocar a audiência. Já a segunda revelação é superior à primeira, e acrescenta uma camada à dinâmica do grupo antes inexistente.

Juntos somos mais fortes

Gemma Chen atua bem no papel da protagonista Sersi. Todos os ótimos atores do elenco entregam boas performances. Porém o filme poderia ter criado uma heroína mais carismática para ser a personagem principal da obra. Durante grande parte, esse protagonismo mais apagado não incomoda, já que os outros personagens presentes conseguem tirar o foco desse problema. Mas no terceiro ato, quando tudo converge e é necessário que a audiência se importe de verdade com Sersi para continuar investida no que está acontecendo, é que fica claro como o desenvolvimento da personagem deixa muito a desejar.

O sentimento que fica é que nenhum dos personagens são bem aprofundados por si só. Sabemos o mínimo sobre eles para entender suas motivações e frustrações, e não é de admirar que os melhores momentos são quando eles estão juntos, interagindo como um time. O que provavelmente foi uma escolha muito consciente dos roteiristas, e que funciona bem nos seus dois primeiros atos.

Novidades valiosas

A cena do beijo entre dois personagens gays, apesar de atrasada considerando quantos filmes vieram antes desse sem nem mesmo mencionarem que existia algum herói ou heroína que não fosse hétero, ainda assim é bonita de presenciar. Principalmente quando pensamos no seu contexto inserida numa comunidade dominada pelo machismo, como é possível ver pela recente polêmica envolvendo um personagem bissexual dos quadrinhos da DC.

Já a levíssima cena de sexo entre outro casal parece uma progressão natural de um momento que é demonstrado entre esses personagens, focando em mostrar o carinho entre duas pessoas que se amam. É interessante finalmente ver algo assim numa saga de tantos filmes que tem uma reunião absurda de pessoas atraentes e aparentemente zero sex appeal. Traz à lembrança, inclusive, o excelente texto “Everyone Is Beautiful and No One Is Horny”, (traduzido livremente para “Todo Mundo é Lindo e Ninguém Sente Tesão”) da Raquel S. Benedict.

Se isso ainda vale ser dito em pleno 2021, quando sabemos que se trata de um problema recorrente e que provavelmente nunca vai mudar, a comédia presente na história tem seus momentos de êxito, mas acaba mais estragando algumas cenas do que adicionando algo de bom a elas. Talvez o filme fosse mais eficiente, também, se mais conciso: Com 2h40 de tela, no terceiro ato o ritmo fica inconstante e cansativo, logo quando deveria empolgar mais.

O êxito de Chloé Zhao

Aqui, a maior força está realmente na dinâmica do grupo e na direção de Zhao. Apesar da instabilidade do ritmo no seu terceiro ato, é ótimo ver a diretora trazer sua visão para um filme dessa escala. Depois de lançar Nomadland e Eternos num intervalo de menos de um ano, duas obras tão diferentes mas com temas chave que permeiam entre as duas narrativas, como as conexões que criamos durante nossa jornada pela vida, é impossível não ficar curioso para ver qual será a próxima história contada pela cineasta.

Para quem já é fã de longa data do universo Marvel, o filme provavelmente vai fazer jus às expectativas positivas que foram criadas. Poucas são as referências feitas aos outros personagens fora dessa obra, mas isso acaba funcionando em favor do filme, já que até mesmo quem não é tão fã pode aproveitar a história sem sentir que está perdendo muito do que veio antes. “Eternos”, apesar de suas falhas pontuais, apresenta um bom entretenimento para quem quiser se desligar do mundo real e curtir uma experiência grandiosa e divertida.

Livia Almeida

Lívia Almeida é comunicadora formada em Rádio, TV e Internet pela UFPE, experiência que a permitiu ter contato com as mais diversas áreas do audiovisual. Tem a sétima arte como companheira desde que se entende por gente, e esse amor pelo cinema se transformou em uma grande vontade de compartilhar suas experiências cinematográficas com outras pessoas. Além do Cinerela, também atua no momento como crítica de cinema no Cinema com Rapadura e no CineSéries. É apaixonada por gatos, música pop e filmes de terror com personagens femininas marcantes.

Deixe um comentário

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Fica a saber como são processados os dados dos comentários.

Next Post

Principais estreias de Novembro/21 nos cinemas

Qua Nov 3 , 2021
Para nossa alegria, com o avanço da vacinação os cinemas vão aos poucos retomando sua atividade e o mês de novembro funcionará como uma espécie de marco dessa retomada. Entre os principais lançamentos do mês estão Eternos, Casa Gucci e Noite Passada em Soho, sendo os dois últimos cotados para o Oscar de Melhor filme em 2022.

Você pode gostar